24 de Abr de 2024

A pesquisa conjunta das universidades de Coimbra, em Portugal, e de Bona, na Alemanha, abre portas para "a identificação de novos medicamentos que possam tratar ou atenuar as alterações visuais inerentes a estas doenças"

O consumo de cafeína, em doses equivalentes a dois/três cafés por dia, protege as células da retina, conclui um estudo realizado por pesquisadores das universidades de Coimbra (Portugal) e de Bona (Alemanha). O estudo abre caminho para o desenvolvimento de "novas abordagens terapêuticas para o tratamento de doenças da visão associadas a episódios isquêmicos, como a retinopatia diabética e glaucoma, duas das principais causas de cegueira a nível mundial", afirma a Universidade de Coimbra (UC).

A isquemia da retina é uma complicação associada às doenças degenerativas da retina, contribuindo para a perda de visão e cegueira, refere a UC, indicando que esta "patologia ocorre por oclusão de vasos sanguíneos, maioritariamente da artéria central da retina, de um ramo da artéria da retina ou por oclusão venosa".

Liderado por Ana Raquel Santiago, pesquisadora no laboratório Retinal Dysfunction and Neuroinflammation da Faculdade Medicina da UC, o estudo foi realizado em ratos e desenvolvido em duas fases. Primeiro, relata a UC, foram "avaliados os efeitos da cafeína nas células da microglia, células imunitárias que funcionam como os macrófagos da retina, mas que em situação de isquemia libertam substâncias nocivas que contribuem para o processo degenerativo".

Os ratos começaram a consumir cafeína durante duas semanas ininterruptamente, tendo sido posteriormente sujeitos a um período transitório de isquemia ocular e, após recuperação, voltaram a beber cafeína. As análises mostraram que "a cafeína controla a reatividade das células da microglia de forma a conferir protecção à retina, quando comparado com animais que bebiam água", acrescenta a UC.

"Nas primeiras 24 horas constatou-se uma ativação exacerbada das células da microglia, indicando que, de alguma forma, a cafeína estava promovendo um ambiente pró-inflamatório para depois garantir protecção e travar a progressão da doença", refere a coordenadora do estudo. Perante estes resultados, e sabendo que a cafeína é um antagonista dos receptores de adenosina (envolvidos na comunicação do sistema nervoso central), a segunda fase do estudo centrou-se em testar o potencial terapêutico de um fármaco, a istradefilina, no controle da inflamação após um episódio isquêmico da retina. Trata-se de uma substância capaz de bloquear a acção dos receptores A2A de adenosina e que tem sido avaliado em outras doenças neurodegenerativas.

"Neste grupo de experiências, observou-se que a administração de istradefilina diminui a reatividade das células da microglia, atenuando o ambiente pró-inflamatório e o dano causado pela isquemia", descreve Ana Raquel Santiago. O medicamento foi testado pela primeira vez na retina, tendo sido administrado após um episódio esquêmico.

Os resultados do estudo abrem portas para "a identificação de novas substâncias que possam tratar ou atenuar as alterações visuais inerentes a estas doenças", sustenta a pesquisadora. "Os recetpores A2A de adenosina podem vir a ser um alvo interessante para travar a perda de visão causada por doenças como o glaucoma ou a retinopatia diabética, duas das principais causas de cegueira a nível mundial", salienta ainda Ana Raquel Santiago.

Atualmente, "não há cura para estas doenças e os tratamentos disponíveis não são eficazes, sendo crucial identificar novas estratégias terapêuticas", conclui. Desenvolvido ao longo de três anos, o estudo foi financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) e pela empresa Manuel Rui Azinhais Nabeiro.

 

 

Fonte: publico.pt