Duas mulheres cegas receberam tratamento. A melhora foi pequena, mas ausência de tumores anima.

Foi publicado, recentemente, o primeiro artigo científico que descreve resultados preliminares do teste de uma terapia com células-tronco embrionárias (CTEs) em humanos.
 
Os cientistas trataram duas mulheres que sofriam de cegueira. Os resultados ainda são tímidos, mas já animam os pesquisadores: depois de quatro meses de acompanhamento, não houve a formação de tumores, grande temor associado à terapia.
 
As duas pacientes receberam injeções em um dos olhos com cerca de 50 mil células do epitélio pigmentar da retina, tecido escuro que serve de suporte para as outras três camadas da retina. Uma delas, de 70 anos, tinha degeneração macular seca, principal causa de cegueira nos países desenvolvidos. A outra, de 50 anos, sofria de uma doença chamada distrofia macular de Stargardt, que afeta pessoas mais jovens.
 
As células injetadas foram derivadas de uma antiga linhagem de CTEs. As pacientes receberam terapia imunossupressora leve para diminuir o risco de rejeição. De qualquer forma, o olho é considerado uma região
imunoprivilegiada, pois a chance de o corpo combater o tecido transplantado é menor.
 
As duas mulheres apresentaram uma pequena, mas animadora, melhora. Os cientistas, no entanto, são cautelosos ao admitir que ela pode não ter relação com as células injetadas, mas sim com a terapia imunossupressora. Uma das pacientes, por exemplo, melhorou dos dois olhos (só um recebeu a injeção).
 
Futuro

O estudo foi divulgado na revista The Lancet. O principal autor, Robert Lanza, é um dos donos da Advanced Cell Technology, empresa americana que pretende comercializar a terapia. Não foi a primeira a injetar CTEs em humanos.
 
Em outubro de 2010, a Geron Corporation começou a utilizar células derivadas de CTEs em pacientes com lesões na medula espinhal. Em novembro do ano passado, no entanto, os testes foram interrompidos sem que os resultados preliminares dos estudos fossem publicados. A Geron argumentou que "falta de dinheiro para investir" e "insegurança do mercado" foram as principais razões para o abandono das pesquisas.
 
A geneticista Lygia da Veiga Pereira, do Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias (Lance) da Universidade de São Paulo (USP), afirma que os autores dos trabalhos quiseram tranquilizar possíveis investidores, depois da decisão da Geron. "Provavelmente publicaram esse artigo para mostrar que as CTEs são um campo promissor e que há grupos obtendo bons resultados nessa área", aponta Lygia.

Claudia Batista, neurocientista da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), concorda. "Mas os resultados são muito preliminares. Será necessário acompanhar essas mulheres por mais alguns anos para se ter certeza de que o risco de tumor desapareceu", afirma.
 
Benefícios para a medicina vão além do uso clínico - Análise de Herton Escobar

Dentre as muitas possíveis aplicações das células-tronco embrionárias (CTEs), a possibilidade de usá-las diretamente no corpo humano, como células regenerativas para o tratamento de doenças e lesões, sempre foi a mais atraente.
 
Indiferenciadas, as CTEs são como células curingas, que podem ser induzidas a se transformar em qualquer tecido do organismo - cardíaco, neurológico, etc. Uma capacidade que as qualifica como candidatas a uma grande variedade de aplicações terapêuticas. Tão grande que muitos passaram a vê-las - equivocadamente - como cura milagrosa para tudo.
 
Muitos cientistas compartilharam desse entusiasmo e dessa esperança. E por isso brigaram tanto para garantir que as pesquisas com CTEs não fossem proibidas. Outra coisa que sempre foi defendida, mas nunca recebeu tanta atenção pública, foi a importância das CTEs como modelos de pesquisa in vitro para a compreensão de processos celulares e moleculares essenciais.
 
As células-tronco embrionárias podem contribuir muito para a medicina sem precisar, necessariamente, serem injetadas em ninguém. São ferramentas fantásticas de pesquisa básica e aplicada sobre os processos de diferenciação celular que regem o desenvolvimento humano - tanto na saúde quanto na doença.
 
Sua aplicação terapêutica direta tem grande potencial, sim, mas carrega uma série de riscos de origem biológica (como a possibilidade de se tornarem células cancerígenas, fora de controle) e de complicações éticas relacionadas ao uso de embriões.
 
Não é à toa que o projeto da Advanced Cell Technology é o único estudo clínico em andamento com aprovação da Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos. Os obstáculos científicos e legais são grandes.
 
O mais provável é que o uso das CTEs fique mais restrito mesmo aos laboratórios e que outros tipos de células "curinga", como as células-tronco adultas e de pluripotência induzida (iPS) - com potencial semelhante ao das CTEs, porém menos complicações - ganhem preferência nas apostas de aplicações clínicas futuras.
 
O que não significa que as células embrionárias perderão importância para a biomedicina. Só não haverá o milagre que tanta gente esperava.






Fonte: Portal Opticanet